Gostava do sargento Tainha, do Recruta Zero, só por causa do nome. Gosto de tainhas desde pequeno.
A tainha da Costa de Caparica, das memórias que guardo de pequeno, é um peixe com uma gordura própria, com um sabor único e distinto. Também me lembro de ver generosas postas de tainha nos lotes de caldeirada que era vendida a granel.
Desportivamente, a sua pesca à linha é emocionante, quando se trata de exemplares de maior porte e lembro-me de uma muito grande que apanhei há uns anos nas Berlengas, que deu um jantar de luxo. Ou as que apanhei ao redor da Marina de Oeiras, quando a sua água era bandeira azul...
No meu historial de pescador, tenho imensas histórias de tainhas, é quase um derby, cheio de pontos curiosos, cheio de vitórias e derrotas.
E há também a taça da liga e a taça de Portugal, onde aparecem as tainhas olhalvo e os garrentos pinta amarela ou garrentos da areia, mais fáceis de pescar e em maior quantidade, mas muito pobres de textura e sabor.
Em Portugal, a palavra "tainha" causa repulsa e as pessoas exclamam "que nojo!"
A maior parte delas só conhecem as do Cais do Sodré, por isso não me espanta nem me choca que digam isso. Concordo que é um risco e uma lotaria, se a sua proveniência for duvidosa, comprá-la numa qualquer banca de peixe. As tainhas de estuário têm o mau hábito de comer areia cheia de nafta e comerem as algas de rochas impregnadas de resíduos de petróleo e dessa borra de gás.
Em Alhandra e em toda a zona litoral ribatejana, são uma instituição, de tal maneira que têm uma espécie só para eles, a tainha-fataça, que é uma delicadeza gastronómica, uma das pérolas das cartas dos seus restaurantes. O maior problema destas tainhas não é a barriga cheia de petróleo, mas o sabor a lodo e lama. Acredito que tal como eu, tenham o maior cuidado em seleccionar a proveniência do ingrediente.
E era aqui que eu queria chegar, à parte gastronómica...a tainha, desde que venha de águas limpas e frias, tem uma carne firme, uma gordura própria, que deixa pequenas bolhas a flutuar no caldo, é um peixe maravilhoso para caldeiradas e dá um prato de forno fantástico. Uma tainha do mar alto numa telha de barro...ai ai ai...
E como ouvi os velhos pescadores dizerem a vida toda "mais vale uma tainha do mar do que um robalo do Tejo, mesmo os de Janeiro, que valem um carneiro".
Acrescento neste lote, ao lote dos peixes menosprezados, as salemas, uma parente do sargo igualmente com complexo de inferioridade. Injustamente, também. Gostam muito de comer algas, pronto.
Alexandre Silva - chef de cozinha do restaurante Bocca, fez recentemente no seu clube de jantares, 4th floor, um prato de tainha, depois de ler o artigo no Ípsilon do Público, deu-me vontade de vir aqui partilhar também a minha simpatia para com o dito animal e fazer-lhe justiça.
Take my love,
Joe Best
Estava prometido, há muito, falar sobre um tema quase tabu e cheio de blindagens, encerrado numa frase lapidar:
"O cliente tem sempre razão".
É lógico que mesmo havendo muita gente que a respeite, nem sempre é verdade...mas o nosso dever enquanto profissionais é não dar azo a que a situação possa piorar, fazendo um serviço sem mácula e com cuidado redobrado.
Um Domingo à noite, estávamos a conversar sem nada que fazer, no restaurante O Português, quando me apercebo que havia gente a ver a ementa no corredor. Era Ricardo Sá Pinto, jogador de futebol do Salgueiros, acompanhado por Pedrosa e ainda pelo preparador físico. Tinham vindo jogar ao Sul, aproveitaram e ficaram a passear pela capital. Reconheci-o, porque pouco tempo antes tinha virado herói de um jogo contra o Benfica, em que marcou o único golo do encontro, de calcanhar.
O que chamou os jovens jogadores à atenção na ementa, foi o bacalhau com natas, que estava escrito em letras garrafais e que todos confessaram gostar muito. Claro que eu o descrevi como o melhor de Lisboa, o que não era mentira nenhuma. E se não era o melhor andava lá muito perto!
Depois dos clientes conquistados pela conversa e pela iguaria top seller, entrámos e escolheram jantar no piso de cima. Apresentei os craques à brigada da loja, que eram na maioria sportinguistas e agraciaram com mimos o herói de Vidal Pinheiro pelo golo marcado ao Benfica. Só quem não achou graça à brincadeira foi o Filipe, um monumento nacional , que era benfiquista.
Depois de um jantar descontraído e um bacalhau com natas aprovadíssimo, Sá Pinto disse-me que iam voltar seguramente, sempre que possível. Foi nas despedidas, que me confidenciou que talvez mais cedo do que nós pensávamos. Alguns tempos depois os jornais anunciavam a contratação dele e de Pedrosa, para o Sporting.
De armas e bagagens em Lisboa, passámos a ter no restaurante, assiduamente, mais dois futebolistas. Desde o tempo de Jesualdo Ferreira como nosso patrão, era frequente termos jogadores do Benfica sentados a comer. Diamantino, Veloso, Silvino ou Hernâni, eram clientes frequentes. Tive à minha guarda o certificado internacional de Paulo Madeira e os bilhetes de identidade dele e da mulher, para lhe entregar, deixado por um agente. Conheci o empresário que quis trazer Jari Litmanen para o Marítimo por 11 mil contos. Conheci Abílio Fernandes, colega de profissão e vice presidente do Sporting, servi o bigodes Jorge Gonçalves e Sousa Cintra. Servi a primeira refeição em Portugal a Mostovoi, quando veio para o Benfica. Servi várias vezes Balakov que trazia sempre a irmã. Manuel Fernandes, Jordão, Mário Jorge e Carlos Xavier eram habituais também. E contrariamente ao que se dizia, o homem de Sarilhos, Manuel Fernandes sabia comer. Também tínhamos a equipa do Marítimo sempre que vinham ao Continente e o presidente da altura, Rui fontes, adorava as minhas alheiras de Mirandela. Cheguei a mandar caixas delas para a Madeira. Tinham um dirigente com quem eu falava muito, porque era da terra da minha avó e apesar de ligado ao Marítimo, era sócio do Guimarães e já havia sido dirigente deles também. Histórias com futebol e futebolistas eram em catadupa, numa base diária. Dezenas de futebolistas, roupeiros, médicos e massagistas. O Português era um restaurante da moda e referenciado pela tribo do futebol. Também houve árbitros. Conheci alguns. Prefiro não falar.
Sá Pinto e Pedrosa. A razão principal deste post. Por tudo e mais alguma coisa. Fizeram do restaurante, a sua zona de conforto fora dos relvados. Os pais deles ligavam-me. Pedrosa perguntou se ia com ele ao stand buscar o seu automóvel novo. Sá Pinto vinha-me buscar para o ir ajudar a escolher música irlandesa à Bimotor e trouxe várias vezes para almoçar a namorada e actual mulher Frederica. Dividiam a conta, à moda do Porto. Era um alargar de horizontes na relação cliente/restaurante.
Um dia, estava no restaurante, mas não estava fardado, passei lá só para ver se estava tudo bem e chegou um grupo para comer. Era o Sá Pinto. Vinham também Pedrosa, Nuno Valente, Carlos Xavier e Luís Vasco, ex-guarda redes do Famalicão. Veio também o marroquino Naybet que havia convidado Hassan do Benfica. Mais tarde, juntou-se Oceano. Convidaram-me para almoçar com eles e como não estava fardado,sentei-me. Ficámos na mesa grande da esplanada e passava muita gente no corredor que parava a olhar porque havia jogadores do Benfica e do Sporting. Aparece um miúdo com um livro de autógrafos e Sá Pinto apresentou-nos a todos. Como é um brincalhão, disse ao miúdo que eu era o novo defesa esquerdo do Sporting, e apresentei-me como Carlos Faria, os meus 2 nomes do meio e autografei o livro. Ainda hoje, por causa da brincadeira do Sá Pinto, deve estar a pensar quem era aquele jogador que nunca viu jogar, o tal Carlos Faria!
Vitória,vitória, acabou-se a história!
JoeBest
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